quarta-feira, 20 de julho de 2011

DICIONÁRIO MÉDICO SEGUNDO O MATUTO

            Um agricultor, 42 anos, residente e natural do sítio Tabocas, distrito de Brejo Grande, Santana do Cariri na Chapada do Araripe (Cariri cearense), acomoda-se diante do Jovem médico, recém-formado e chegado da Capital.
            _ Bom dia, dotô?
            _ Bom dia, seu Joaquim, o que o senhor tem?
            _ Bem, dotô. Tenho uma casinha no pé da serra, 2 vaquinha (que tão inté maga), 2 cabrinha e umas galinhazinhas soltas pelo terrêro. Ah! Tem tumbém uma cachorra – a zabelê e 4 fí que tão só o coro e o osso.
            _ Não, seu Joaquim, o que o senhor está sentindo?
            _ Ói, dotô. Na verdade, na verdade tô sentindo vontade de vedê tudo e ir me’ bora.
            Assim começou o diálogo entre o jovem médico e seu Joaquim – cabra sertanejo que visita a cidade só em dia de feira, trabalhador de roça em tempo de inverno e de frente de serviço na seca.
            _  Seu Joaquim, o senhor veio procurar o médico por quê?
             - Bem dotô!
            _ Ói! Vim percurá o sinhô promode num sô mais o mermo. Anda vingano umas maledicência n’eu que to sem agüentá
            Meio desorientado com o vocabulário apresentado pelo agricultor, mas acreditando ter que manter sua postura de doutor, o médico continuou a consulta.
            _ Pois então diga o que é?
            _ Pra cumeçá, to c’uma dô nas pá – bem nas ponta das cruz- descendo no êxo do tronco partindo pros fecho dos quarto. Chegano nas cadêra se espáia pra bacia, descendo pras perna, passando por trás das canela – mermo nas batata da perna- indo inté o rejeito.
Seu Joaquim ainda continuou, não dando chance ao médico interrompê-lo.
            _ Inda tô apresentando um arguêro na menina dos zói que num tem picinêz que dê jeito (inté já recebi um do vereador Zé de Biu e outro de Elizeu – meu cumpade, mas mermo que nada)
            _ Ói,
            _ Tô c’uma pereba na cantarêra que coça que só a mulesta. A guela e a campainha é inchada direto. É um roncado na boca do estambo, um gosto azedo na boca, um aperrei no juízo, as oiça curta.
            _ Seu dotô, o sinhô me imagina que inté na hora de fazê as obrigação é uma peleja da peste. Boto força, fico rochim...prá saí uma coisinha de nada e, tem mais, pôde que num tem cristão que agüente. Na hora de vertê água é ôtro aperrei – o mijo sai de pingo em pingo- parecendo conta de rosário na mão de beata.
            _  Os dotô do Crato já passaro uns caxete – é cada píula que dá medo. Agente sente inté uma miora, más é pôca. E o sinhô, qué que diz?
             A essa altura, o jovem letrado médico, mostrava um certo pânico no olhar, diante do queixoso seu Joaquim. Pouco entendera o que se passava com aquele homem diante de si.
            _ Bem, Vamos solicitar uns exames depois o senhor volta, ok?
             Naquele dia, o Jovem médico viu-se frustrado por não ter sido apresentado, ainda na faculdade, a um certo dicionário médico segundo o matuto.
   
Júlio Lima
Médico Ortopedista/ Traumatologista
Professor


6 comentários:

  1. E o povo ainda diz que vida de médico é fácil, né júlio/!!!

    ResponderExcluir
  2. huhsusahhusa... adoro quando tu conta esses causos.... beijuuuuuuuuu

    ResponderExcluir
  3. A consulta do matuto com o dr. da capital.

    ResponderExcluir
  4. Esse seu Joaquim tá morto "homi"...kkkkkkkkkkk, Pode comprar o caixão, com certeza tem uma funerária aí do lado desse hospital, compra lá...kkkk

    ResponderExcluir
  5. para um médico ortopedista, formado pela universidade da Paraiba é uma peça muito importante que provoca risos e faz desopilar o fígado.
    Muito Bom. O Amigo está na profissão errada. Deveria estar na Globo fazendo
    o povo rir.
    Muito bom, mesmo!
    um abraço
    jose luiz gomes

    ResponderExcluir